O cachecol de Portugal...
Há 12 anos estava em Bissau. Tinha chegado em abril, e, longe de tudo e todos, dei por mim a vibrar com o campeonato da Europa como nunca tinha acontecido até então.
Fora de casa, feita emigrante, a relação com o país assume outras dimensões. Eu, docente da Faculdade de Direito de Lisboa, destacada na Faculdade de Direito de Bissau, era, acima de tudo, funcionária do Estado Português e uma representante da nossa nação.
O primeiro jogo foi visto no Senegal, com um casal amigo, com quem estava de férias, pela primeira vez naquele país. Estávamos numa tasca local, com uma pequena televisão ligada num canal francês. E lembro-me de que comemos umas sandes de omelete, que me souberam pela vida.
Os restantes jogos foram vistos em grupo, com a comunidade portuguesa. Festejávamos um pouco mais tarde os golos, que lá chegavam com o delay próprio da distância, primeiro via rádio e, depois, via televisão, mas, na final, foi diferente.
Um mal entendido determinou que a final não fosse transmitida no local de sempre e eu, com mais três pessoas, decidimos mover o que fosse necessário para transmitir o jogo num local público (um estádio, no centro da cidade), de forma gratuita, com um lençol gigante e um projetor.
Assim foi. A luz não ajudou a que a primeira parte do jogo se visse nitidamente. Mas , à medida que o jogo avançava, tudo se via melhor, até ao golo que determinou a nossa derrota.
Nesse jogo, portugueses éramos praticamente 4 ou 5 na audiência. Todos os outros eram guineenses, que, na sua maioria, torciam por Portugal.
Lembro-me que levava arrumado na mala um cachecol que, dias antes, o Adido da Cultura me tinha dado. Eu, num misto de timidez e vergonha, guardei-o na mala, e estava a planear tirar aquando da vitória, que não aconteceu...
Doze anos depois, e várias horas antes de mais uma final, peguei no cachecol (já não o de Bissau, que está guardado algures cá em casa, mas noutro) e prendi-o à varanda. Honestamente, acreditava na vitória e acreditava que, se o demonstrasse publicamente, talvez a sina do passado não se voltasse a repetir.
Assim foi... Curiosamente ou não, graças às defesas fantásticas de um grande guarda-redes e ao golo de um luso-guineense...
Foto: Miguel A. Lopes/LUSA, via JN.