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Mai24
A minha avó Leonor
Mónica Lice
A minha avó Leonor era uma mulher incrível.
Tirou carta de mota com mais de 60 anos, comprou um carro e passou a transportar o meu avô, que não trocava o seu burrico pelas modernices de quarto rodas e com motor.
A minha avó enviava-me cartas. Escritas à mão com caligrafia antiga, e aquela poesia da prosa antiga, que infelizmente já se perdeu. Recebi-as com gosto, quer nos primeiros anos de Lisboa, quer também na Guiné, e era sempre bom lê-las e sentir a ilha e a família mais perto.
A minha avó aprendeu a enviar e-mails. Ofereceram-lhe um computador e, desta forma, trocou as cartas pelas tecnologias e enviava-me missivas on-line, ao mesmo tempo que atendia chamadas pelo skype.
A minha avó teve vários filhos, perdeu alguns e conseguiu criar 5, teve netos e bisnetos, que nunca a deixaram.
A minha avó podia ter sido professora. A vida não permitiu que concretizasse o sonho. Trocou a escola por uma família, mas ficou com o gosto pela escrita, que felizmente nunca perdeu.
A minha avó costurava e bordava. Durante a minha adolescência, pedi que me costurasse uma saia comprida, vermelha, às flores, que usei um verão inteiro.
Foi com ela que fui pela primeira vez aos EUA. Ela adorava viajar e não tinha medo de se enfiar sozinha num aeroporto, tendo como destino o outro lado do Atlântico, que tanto a fascinava.
Habituei-me a passar sempre alguns dias de férias em sua casa. Fazíamos pizzas de atum, víamos o Preço Certo e partilhávamos conversas simples e felizes.
Ontem, perdi-a. Trocou a vida humana por outra dimensão, com o intuito, com toda a certeza, de se encontrar de novo com o seu Humberto.
E eu deixei de ser neta. Sou agora filha e mãe. Imensamente privilegiada por ter tido uma avó até aos meus 43. Mas de coração apertado por já não a ter aqui.